DER Av. Tereza Cristina, 3826 Gameleira Belo Horizonte Fone: 31 3235 1000 Atendimento de seg. a sex. das 8h às 18h.
DETRAN Av. João Pinheiro, 417 Centro Belo Horizonte Fone: 31 3236 3500 Atendimento de seg. a sex. das 8h à 16h.
ESTAÇÃO FERROVIÁRIA Rua Arão Reis, 423 Centro Belo Horizonte Fone: 31 3273 5976 Abre de seg. a sex. das 6h às 17h30, sáb. das 6h às 15h30, dom. das 6h às 12h.
SECRETARIA MUNICIPAL DE SEGURANÇA URBANA E PATRIMONIAL
A Secretaria Municipal de Segurança Urbana e Patrimonial (SMSEG) foi criada pela Lei no. 8.620/03, com o objetivo de coordenar as políticas municipais na área de segurança, em colaboração com o Estado e a União, visando reduzir o índice de criminalidade no município de Belo Horizonte. Compete à Secretaria, segundo determinam os incisos I e II, do artigo 2º , da referida Lei: “... I - no âmbito das políticas de segurança no Município: a) planejar a operacionalidade das políticas de segurança no âmbito do município, para reduzir a criminalidade;b) viabilizar o entrosamento do poder público municipal com os órgãos de segurança de outros níveis federativos que atuem em Belo Horizonte;c) auxiliar na obtenção de linhas de crédito específicas para programas voltados para a segurança;d) coordenar as atividades da Guarda Patrimonial do Município;e) fomentar a participação da comunidade na formulação e aplicação das políticas de segurança; II - no âmbito das Políticas de Segurança Social;a) financiar estudos e desenvolver projetos voltados à segurança, em parceria com a comunidade, órgãos públicos e entidades da sociedade civil;b) planejar a operacionalidade das políticas públicas de segurança social, em conjunto com órgãos municipais, visando à diminuição da criminalidade;c) formular e aplicar, diretamente ou em colaboração com órgãos municipais, métodos preventivos para reduzir a violência e a sensação de insegurança. ...”
HISTÓRIA DA GMBH
A Guarda Municipal de Belo Horizonte (GMBH) foi criada em 20 de janeiro de 2001 pelo prefeito Fernando Damata Pimentel, através da Lei nº 8.486/03. Com base no permissivo constitucional (art. 144, da Constituição Federal de 1988), bem como no imperativo legal de que a segurança pública é “dever do Estado, direito e responsabilidade de todos”. Segundo o ordenamento jurídico, os novos órgãos públicos de segurança foram criados com a missão de coordenar e desenvolver ações integradas de defesa social e segurança urbana, num trabalho conjunto com as demais forças existentes, nos âmbitos municipais, estaduais e federais. O surgimento da GMBH atendeu ao clamor da população, que anseia por mais segurança nos estabelecimentos municipais. Assim, com o advento da Guarda Municipal, a administração pública passou a dispor de um instrumento de política urbana, em prol da defesa social. Sua missão é garantir segurança aos órgãos e patrimônio do poder público municipal, bem como orientar e proteger os agentes e usuários dos serviços públicos. Trata-se de um órgão integrante da administração direta do Poder Executivo Municipal, organizada com base na hierarquia e disciplina, sob a autoridade suprema do Prefeito. Atualmente, a GMBH conta com um efetivo de mais de 2 mil servidores, entre Guardas Municipais e Inspetores, regidos pelo Comando, nos aspectos técnicos e operacionais.A violência tornou-se um fenômeno comum em todas as metrópoles brasileiras. O cenário da insegurança pública foi diagnosticado por inúmeros estudos, que comprovaram a relativa ineficiência dos métodos tradicionais de combate e prevenção à violência urbana e à criminalidade. A criação dos órgãos municipais de segurança é fruto de um processo de amadurecimento e convencimento dos gestores e administradores públicos e da sociedade, por meio de suas instituições e lideranças legitimamente constituídas. No final da década de 1990, a prefeitura criou o Conselho Municipal de Defesa Social (CMDS), por meio da Lei 7.616, de 10 de dezembro de 1998. O órgão funcionava como um colegiado, de caráter consultivo e vinculado à Secretaria Municipal e Governo, dotado de autonomia administrativa e financeira. Atualmente, está vinculado à Secretaria Municipal de Segurança Urbana e Patrimonial. O CMDS é composto por representantes do Poder Executivo Municipal, da Câmara Municipal, da Secretaria de Defesa Social, das Polícias Militar, Civil e Federal, do Ministério Público Estadual, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), das Universidades e dos representantes de associações de moradores. O CMDS surgiu como arena pública de debate e reflexões sobre o problema da criminalidade e segurança pública municipal a partir da constituição de uma agenda mínima sobre o tema. Por meio do Conselho, houve mobilização de instituições e representantes legítimos da sociedade. Nas propostas que se seguem estão inscritos os parâmetros maiores de uma sociedade democrática, quais sejam, o da participação civil, o da eqüidade e prevenção das ações e das políticas públicas no campo da cidadania, fatores decisivos de uma ordem social democrática, socialmente justa e fundada no respeito dos direitos fundamentais da pessoa humana.
A Guarda Municipal pode ser mais que apenas uma corporação, pode ser principalmente solidária, dinâmica e uma grande prestadora de atendimentos de excelência em várias áreas de atuação para a população, trazendo benefícios com idéias simples e com um custo quase que inexistente. Existem vários programas das Guardas Municipais no Brasil que estão apresentando resultados positivos junto a sua localidade. Em virtude da sua atuação direta com a comunidade, as Guardas Municipais passam a conhecer as tipicidades dos bairros, a ponto de, em determinadas regiões, onde a insegurança era premissa máxima, agora o cidadão já pode dizer: “eu estou me sentindo mais seguro, quando caminho pela minha cidade”. O maior dilema da Guarda Municipal, enquanto prestadora de serviço de Segurança Pública Municipal, na esfera municipal, não é encontrar resistência frente à legislação vigente, doutrina ou jurisprudência, mas na intransigência de alguns dirigentes que a vêem como uma concorrente. Cabe lembrar que quanto mais precária é a segurança oferecida pelo Poder Estatal, maior será o número de prestadoras de serviço de segurança particular, muitas na clandestinidade, onde acabam colocando em risco seus próprios contratantes. À medida que a criminalidade aumenta no país em proporções assustadoras, surgem tendências político-partidárias querendo diminuir a competência na área de segurança pública por parte dos municípios. Como podemos observar, em um determinado estado brasileiro, através da Diretriz nº PM3-001/02/01, editada em janeiro de 2001, pelo comando geral, a finalidade era repassar aos comandos locais o que segue abaixo: “Padronizar os procedimentos das OPM em relação às guardas municipais existentes, bem como, aqueles a serem adotados junto ao poder público municipal nos municípios em que houver pretensão de criação dessas instituições e outras providências a serem adotadas para desestimular iniciativas nesse sentido.” (grifo nosso). Percebe-se claramente que a preocupação deste comando não está voltada à área de Segurança Pública dos municípios em pauta, mas sim, nas lacunas deixadas por esta instituição, em virtude do seu sistema metódico e de certo modo arcaico, onde torna-se ineficiente frente às necessidades básicas da comunidade. O medo maior está na concorrência de um órgão público municipal capaz de diminuir os índices de insegurança local. Anteriormente, a preocupação estava centrada no estado, em virtude da dicotomia policial. O governo federal, buscando pôr um fim a esse dilema, iniciou o processo de integração das instituições policiais. Para alguns comandantes retrógrados manterem-se ocupados, optaram em começar a se preocupar com a existência e manutenção das Guardas Municipais, esquecendo da sua principal função que é oferecer Segurança Pública de qualidade. Por outro lado, enquanto estes comandantes digladiam-se politicamente, a criminalidade vem crescendo e se organizando cada vez mais, a ponto de tornar o povo e a polícia reféns em suas próprias casas e casernas. O crime nas grandes cidades tornou-se insustentável. O criminoso passou a desafiar as próprias instituições de segurança, que acabam por ser invadidas ou tornam-se objetos de atentados. No Estado do Paraná, por sua vez, as organizações policiais têm adotado um relacionamento mais profissional, onde policiais civis e militares, junto com os guardas municipais, trabalham lado a lado no combate ao crime, cada um respeitando a sua área de atuação e, quando necessário, dando apoio à outra instituição. Servindo como exemplo está a Operação Integrada, onde, juntos, Polícia Militar, Polícia Civil, Corpo de Bombeiro, Ministério Público e a Guarda Municipal de Curitiba, com demais órgãos da Prefeitura Municipal de Curitiba, vêm trabalhando semanalmente, há mais de três anos, nas fiscalizações de estabelecimentos comerciais da grande Curitiba. Deste modo, não há o que se falar de milícias, mas de Guardas Municipais atuando em sintonia com os poderes públicos constituídos e sob a exegese da lei, cumprindo com a sua função constitucional e buscando minimizar os índices de insegurança nesta Capital. Por sua vez, cabe lembrar que a Guarda Municipal não está exclusivamente voltada para a segurança pública, conforme os moldes do Regime Militar, mas sim para atuação na área de defesa social que corresponde a uma parcela significativa da prestação de serviço à comunidade de maneira extensiva, o qual abrange segurança pública, defesa civil, entre outras ações do poder público. Defesa Social é a concepção de justiça criminal como ação social de proteção e prevenção, caracterizando-se pela aceitação da mutação de acordo com a evolução da sociedade. O Direito Criminal é, então, parte da polícia social; o crime está na sociedade, o homem apenas o revela. A eficácia do Direito Penal e da polícia em geral no controle da criminalidade é apenas de relativa importância. A prevenção prevalece sobre a repressão. A criminalidade não se resolve no contexto restrito da Segurança Pública, mas em um programa de ampla defesa social, isto é, numa política social que envolva o punir (quando útil e justo) e o tratamento ressocializante do criminoso e do foco social de onde emerge. Desta forma, a Guarda Municipal, sendo a prestadora de serviço que trabalha diuturnamente representando o Poder Público Municipal, em todos os bairros e periferias, torna-se uma das poucas instituições do município capaz de dar o pronto-atendimento às necessidades locais. Por fim, conforme Theodomiro Dias Neto comenta, “Pesquisas norte-americanas realizadas durante os anos de 60 e 70 revelaram que embora a cultura e estrutura policial estivessem inteiramente voltadas à repressão policial, parte significativa dos pedidos de assistência referia-se a pequenos conflitos. Hoje é fato conhecido que a polícia, mesmo em contexto de alta criminalidade, chega a consumir 80% de seu tempo com questões como excesso de ruído, desentendimento entre vizinhos ou casais, distúrbios causados por pessoas alcoolizadas ou doentes mentais, problemas de trânsito, vandalismo de adolescentes, condutas ofensivas à moral, uso indevido do espaço público, ou serviços de assistência social, como partos”. (grifo nosso) Como vimos na pesquisa, o que nos Estados Unidos era realidade nos anos 60 e 70, aqui no Brasil continua sendo uma rotina, a qual necessita, com uma certa urgência, ser revista pelos Poderes Públicos constituídos. As Guardas Municipais têm contribuído de maneira significativa nestes diversos tipos de atendimento acima citados, entre outros mais.
Por:Claudio Frederico de Carvalho
ATENTADO AO PUDOR
O título VI do Código Penal (CP) trata dos crimes contra os costumes, classificando-os, nos vários capítulos, em ‘crimes contra a liberdade sexual’, ‘sedução e corrupção de menores’, ‘rapto’, ‘lenocínio e tráfico de mulheres’ e ‘ultraje público ao pudor’. Nesses crimes, um dos critérios que ensejam mais severa reprimenda é o cometimento mediante violência ou grave ameaça, e tais são o estupro, o atentado violento ao pudor e o rapto violento ou mediante fraude, desconsiderados os casos de violência presumida. A violência é elementar dos tipos descritos nos referidos crimes, tanto que o CP não se refere a estupro violento, por exemplo. Daí a questão: haveria um atentado ao pudor sem violência?Poder-se-ia argumentar que não há atentado sem agressão violenta, mas tal entendimento não prospera, pois, se assim fosse, o nome jurídico do crime dispensaria o vocábulo ‘violento’. Além disso, o atentado ao pudor mediante fraude exclui a violência. A violência não é, contudo, elementar de outro crime igualmente grave, o homicídio, podendo qualificá-lo, quando muito, pelo excesso (crueldade), embora na maioria deles ela esteja presente. O mesmo ocorre quanto às lesões corporais e outros crimes preterdolosos, cujas penas são exasperadas quando do evento morte, o que pressupõe, quase sempre, a violência. Ela é elementar, porém, alternativa ou cumulativamente com a grave ameaça, dos crimes de constrangimento ilegal, roubo, extorsão, alguns crimes contra a organização do trabalho, coação no curso do processo e outros, sem a qual tais crimes seriam totalmente descaracterizados ou subsistiriam como figuras penais diversas.Com pena equivalente à do estupro, determinada pela Lei nº 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), o CP tipifica o que seja atentado violento ao pudor, da seguinte forma:“Art. 214. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Pena – reclusão, de seis a dez anos”. A pena anterior era de dois a sete anos de reclusão. O parágrafo único, acrescentado pela Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) e revogado pela Lei nº 9.281/96, estabelecia pena de reclusão, de três a nove anos, se o ofendido fosse menor de catorze anos.Na própria legislação pátria pretérita, o atentado violento ao pudor foi sempre tratado até com mais rigor que o estupro. Como exemplo, as Ordenações, tratava dos crimes de ‘forçar mulher’ (estupro) e sodomia, sendo este, objeto de mais severas penas e maiores restrições de caráter processual. Acompanhemos a evolução do tipo penal em nosso ordenamento jurídico, começando com as Ordenações Filipinas (Livro V), que previam, no Título XIII – Dos que commettem peccado de sodomia, e com alimarias:“Toda a pessoa, de qualquer qualidade que seja, que peccado de sodomia per qualquer maneira commetter, seja queimado, e feito per fogo em pó, para que nunca de seu corpo e sepultura possa haver memoria, e todos seus bens sejam confiscados para a Corôa de nosso Reinos, postoque tenha descendentes; pelo mesmo caso seus filhos e netos ficarão inhabiles e infames, assi como os daquelles que commettem crime de Lesa Magestade”. E nesse diapasão eram condenados os do mesmo sexo que tinham contatos entre si, os ajuntamentos com animais, estipulando penas atrozes e infamantes, perdimento de bens e até a – aparentemente nova – delação premiada (com os bens do delatado). Quanto aos atos libidinosos de menor reprovação, o § 6º dispunha:“E vista a graveza do caso, os Julgadores serão advertidos, que quando os tocamentos deshonestos e torpes não forem bastantes para, conforme a esta Ordenação e Direito, se haver per elles o delicto por provado, de maneira que os culpados devão haver a pena ordinaria, ao menos os taes tocamentos se castiguem gravemente com degredo de galés, e outras penas, segundo o modo e perseverancia do peccado”. No Título XVIII (Do que dorme per força com qualquer mulher, ou trava della, ou a leva per sua vontade), assentava-se, no § 2º:“E se algum homem travar de alguma mulher, que fôr per a rua, ou per outra parte, não sendo para dormir com ella, sómente por assi della travar, seja preso, e até trinta dias na cadêa, e pague mil reis para o Meirinho, ou Alcaide, ou outra pessoa, que o accusar”.O Brasil independente abrandou o rigor filipino, e o Código Criminal do Império tratava da questão no Título II (Dos crimes contra a segurança individual), Capítulo II (Dos crimes contra a segurança da honra), Secção I (Estupro), prevendo pena de um a seis meses de prisão simples e multa, devendo o infrator, ainda, dotar a vítima. Note-se a exigência do resultado dor ou mal corpóreo à vítima (violência real):“Art. 223. Quando houver simples offensa pessoal para fim libidinoso, causando dor ou algum mal corpóreo a alguma mulher, sem que se verifique a cópula carnal”. Com a República, veio o Código Penal de 1890 (Decreto nº 847), dispondo, no Título VIII (Dos crimes contra a segurança da honra e honestidade das famílias e do ultraje público ao pudor), Capítulo I (Da violência carnal):“Art. 266. Attentar contra o pudor de pessoa de um, ou de outro sexo, por meio de violencia ou ameaças, com o fim de saciar paixões lascivas ou por depravação moral”. Aqui a pena foi exasperada para prisão celular de um a seis anos, mantido o dote. Parece ter havido um equívoco do legislador, ao manter a gradação numérica e alterar o tempo, de meses, para anos. Assim se infere porque esse Código, a exemplo do Código Criminal do Império, procurou atenuar as penas cruéis daquela época, seguindo tendência mundial desde Beccaria. Inovou-se com a presunção de violência para vítima menor de dezesseis anos e com a regra processual da decadência em seis meses. Chamava estupro ao abuso com violência, sem referir-se especificamente à conjunção carnal. O código explicitava que a violência não derivava apenas da força física, mas, também, da privação das faculdades psíquicas, de modo a suprimir a possibilidade de a vítima se defender, mediante uso do hipnotismo, clorofórmio e narcóticos, entre outros casos.Antes do atual código, face à caótica profusão de leis penais extravagantes, adotou-se uma Consolidação das Leis Penais (Decreto nº 22.213/32), que repetia o CP/90 em seu art. 266, estabelecendo para o mesmo crime a pena de prisão celular por um a três anos, reduzindo à metade o rigor da pena máxima até então prevista. Subsistia a queixa como condição de procedibilidade, exceto quando praticado o crime nas pessoas dos alienados.O regime militar procurou implantar um novo código penal (Decreto-lei nº 1.004/69), o qual, porém, não chegou a entrar em vigor. Seu art. 239 trazia o mesmo texto e, como inovação, o núcleo ‘presenciar’, ausente no CP em vigor. A pena, de reclusão de dois a seis anos, abrandava ligeiramente o máximo então vigente. No atual anteprojeto de reforma do CP, sob o Título II (Dos Crimes contra a Dignidade Sexual), Capítulo I (Dos Crimes contra a Liberdade Sexual), repete-se, no art. 161, o mesmo texto do art. 214 do CP vigente, acrescentando-se diversas figuras qualificadas e causas específicas de aumento de pena. A pena da figura simples é reduzida para quatro a oito anos de reclusão.Verifica-se, portanto, que o atentado ao pudor não teve um tratamento uniforme ou tendente ao abrandamento da sanção, ao longo da história, como seria de se esperar. De sorte que hoje se afigura extremamente rigorosa a pena para o atentado ao pudor cometido mediante destreza, sem violência real ou ameaça, que, por uma enviesada compreensão do dispositivo legal, às vezes acaba sendo tratado como atentado violento ao pudor.São situações que melhor se adequariam às contravenções de importunação ofensiva ao pudor e perturbação da tranqüilidade (Damásio), todavia, mais censuráveis. É o caso do ato libidinoso consistente, por exemplo, no levantamento das vestes da vítima, para contemplação lasciva ou mesmo exposição ao ridículo. Assim, também, certas condutas exibicionistas, não subsumíveis ao ato obsceno (art. 233, do CP), além da apalpação dos órgãos genitais, nádegas e seios da vítima. Há sentenças extremamente rigorosas em casos tais, em que o magistrado agira legitimamente, às vezes a contragosto, por estar jungido a uma lei draconiana, também vinculante para a autoridade policial e o promotor.Dos atos libidinosos não consentidos diversos da conjunção carnal, particularmente ignominiosos são o coito anal e o coito oral (irrumatio in ore) que, pelo caráter de invasibilidade, causam extremo opróbrio à vítima. Igualmente traumatizante é o contato físico do agressor, especialmente de suas partes pudendas com qualquer parte do corpo da vítima, destacando-se o coito interfemora. Essas condutas, não consentidas, evidentemente só podem ser efetivadas mediante violência ou grave ameaça.Quanto às demais, talvez o ideal fosse o estabelecimento de um tipo penal intermediário entre o atentado violento ao pudor e a importunação ofensiva ao pudor, que poderia ter o nome jurídico de atentado ao pudor (não violento, portanto). Esse tipo abrangeria as condutas fronteiriças exemplificadas, que deixariam de ser consideradas crime hediondo – com todas as suas implicações penais e processuais – mas com sanção proporcional e razoavelmente rigorosa, conforme à gravidade do delito. Evidente que o consentimento da vítima, excetuado o caso de violência presumida e ausente, também, a violência real, descaracterizaria o crime.Exemplificando, uma situação que não envolva violência ou grave ameaça pode ser aquela em que o autor se aproveita do sono da vítima ou até o provoque mediante aqueles artifícios previstos no Código de 1890. Aí não haveria fraude, já que esse conceito está relacionado à indução da pessoa a praticar ou permitir que se pratique o ato libidinoso, ou seja, pressupõe alguém consciente. Não haveria como enquadrar o autor no art. 214 nem no 216, ficando difícil até mesmo admitir o fato como contravenção. O único efeito é o de ser considerada a agravante genérica do art. 65, inciso II, alínea c, do CP, mas em relação a que crime? Nem a doutrina nem a jurisprudência traz esclarecimento suficiente a respeito.De outro modo, a simples redução do mínimo penal a um ano, para efeito de possibilitar a suspensão condicional do processo quando as circunstâncias do crime indicassem menor reprovabilidade, esbarraria na dificuldade de se lhe aplicar, também, as restrições previstas para os crimes hediondos, bem como na do magistrado ao fixar a pena base.Assim, propõe-se que o elemento normativo do ‘atentado violento ao pudor’ seja aquele consistente nas referidas condutas invasivas, além dos contatos genitais (tocar com suas genitálias nuas ou secreções genésicas qualquer parte do corpo da vítima ou, ainda, tocar, com qualquer parte do próprio corpo ou objeto, as genitálias nuas da vítima), mediante emprego de violência ou grave ameaça.Poderíamos ter, então, o atentado violento ao pudor na forma privilegiada, com a mesma pena do atentado ao pudor mediante fraude, visando a estabelecer a fronteira entre o ato libidinoso cometido mediante violência ou grave ameaça, que seja aviltante, daquele menos grave. Adiantando as hipóteses do elemento normativo, teríamos as condutas pelas quais, mediante os mesmos recursos, o autor apalpa os órgãos genitais, nádegas ou seios da vítima, ainda que por sobre as vestes, ou a desnude, expondo partes íntimas, mesmo vestidas. Nesse sentido, propõe-se acrescentar um parágrafo ao art. 214 do CP, assim:§ 1º Se o ato libidinoso não consistir em contato dos órgãos genitais com qualquer parte desnuda do corpo da vítima ou, contato por qualquer outro meio, com suas partes íntimas ou se a conduta consistir em expor-lhe ou tocar-lhe, diretamente ou por qualquer outro meio, as partes íntimas, ainda que vestidas:Pena – reclusão, de um a dois anos.Justifica-se tal comando porque referidas situações, além de serem igualmente aviltantes, pelo fator surpresa poderiam, eventualmente, comprometer a honra da pessoa. Poderiam se revestir, também, em circunstâncias excepcionais, de perigo concreto para a saúde da vítima.Essas mesmas condutas fronteiriças restariam subordinadas ao tipo ‘atentado ao pudor’ se ausente violência ou grave ameaça, mais reprováveis, contudo, que a simples importunação. Como exemplo do tipo, cometido sem violência ou grave ameaça (mediante destreza), sob a epígrafe ‘atentado ao pudor’, poderíamos ter:§ 2º Se o crime é cometido sem violência ou grave ameaça:Pena – detenção, de seis meses a dois anos. É corriqueiro o homem do povo utilizar a expressão ‘atentado ao pudor’ ao referir-se às situações tidas como condutas menos reprováveis, o que vem a confirmar o sentimento de que há, sim, um atentado ao pudor não violento.
Por: Claudionor Rocha
A GUARDA MUNICIPAL E O ESTATUTO DO DESARMAMENTO
Com a nova legislação em vigor, tratando sobre o Estatuto do Desarmamento e legislações posteriores, é mister que as instituições policiais venham a se adequar aos preceitos legais. Desta forma, as Guardas Municipais, para que continuem atuando dentro da esfera da legalidade, impreterivelmente, terão que se afeiçoar ao estatuído pela Lei Federal n.º 10.826/03, Decreto Federal n.º 5.123/04. Seguindo esta temática, convém ressaltar que a formação funcional dos integrantes das Guardas Municipais terá que ser realizada em estabelecimento de ensino de atividade policial, autorizada pelo Ministério da Justiça. Ainda, outro item de suma importância, trata dos tipos de porte de arma, conforme a quantidade populacional do município. Deste modo, considerando as suas peculiaridades, existem dois tipos de porte de arma para as Guardas Municipais: a particular (pessoa física) e a funcional (pessoa jurídica). Vejamos: - Para as capitais dos Estados e os municípios com mais de 500.000 habitantes, independente de ser uma grande metrópole ou município da Região Metropolitana, os integrantes da Guarda Municipal passaram a ter direito aos portes de arma pessoal (particular) e institucional (funcional), sendo que para o último, independente de estar ou não em serviço; - Para os municípios com mais de 50.000 e menos de 500.000 habitantes, os integrantes da Guarda Municipal, passaram a ter direito aos portes de arma pessoal (particular) e institucional (funcional), sendo que este último, somente em serviço; - Para os municípios que integram a Região Metropolitana, desde que não tenham uma população acima de 500.000 habitantes (já mencionado anteriormente), cabe aos seus integrantes o direito aos portes de arma pessoal (particular) e institucional (funcional), sendo que este último, também somente em serviço, conforme nova redação dada pela Lei n.º 10.867/04, acrescentando o § 6º, no art. 6º da Lei n.º 10.826/03. O que merece um cuidado especial diz respeito às armas da própria corporação, que poderão ou não obter autorização para aquisição, bem como a liberação destas armas aos seus integrantes, podendo ser exclusivamente durante o turno de serviço ou sem restrição quanto ao porte das mesmas. Cabe lembrar, que caso as Guardas Municipais venham efetivamente a exercer o seu direito do porte de arma, faz-se antes necessário preencher os requisitos, tais como, a criação de uma Ouvidoria e de uma Corregedoria. DA OUVIDORIA Conforme preceitua o Art. 44, Parágrafo Único do Dec. n.º 5.123/04, “... da existência de Ouvidoria, como órgão permanente, autônomo e independente, com competência para fiscalizar, investigar, auditorar e propor políticas de qualificação das atividades desenvolvidas pelos integrantes das Guardas Municipais”. Entende-se que as Guardas Municipais, a fim de manter o controle externo, necessitam da existência de uma Ouvidoria, como órgão autônomo e permanente, tendo o poder investigatório próprio. Por tratar-se de um controle externo, o mesmo deverá ser independente, podendo ser representado por membros do Ministério Público e dos Conselhos Comunitários de Segurança, dentre outros. Atualmente, este tipo de serviço, vem sendo desempenhado pelas prefeituras municipais, através do “disque-denúncia”, ou nos sítios cibernéticos institucionais, não tendo, contudo, a capacidade legal de fiscalizar, auditorar e propor políticas, servindo apenas como instrumento de reclamação quanto a possível infração funcional. DA CORREGEDORIA Do mesmo modo, pautado no Dec. n.º 5.123/04, em seu Art. 44, “... as Guardas Municipais dos municípios que tenham criado Corregedoria própria e autônoma, para apuração de infrações disciplinares atribuídas aos servidores integrantes do Quadro da Guarda Municipal”. Tratando-se da Corregedoria, sendo um mecanismo de controle interno, o mesmo ...“deverá ser supra corporativo, envolvendo representantes de várias instituições e membros da própria Guarda Municipal, em rodízio, para evitar estigmatizações ou prejuízos na progressão da carreira”, conforme estudos realizados pelo Instituto Cidadania – Fundação Djalma Guimarães, os quais serviram como balizadores para edição da presente legislação. Convém ressaltar, que a Corregedoria está direcionada para a apuração de infrações disciplinares, bem como aplicação das medidas cabíveis, devendo, entretanto, este organismo de controle ser próprio e específico para os integrantes da corporação, mantendo uma autonomia em relação à corporação Guarda Municipal, mas não necessariamente desvinculada da pasta municipal, as quais ambas estariam atreladas, tendo em vista a necessidade efetiva do controle funcional dos seus respectivos dirigentes. Atualmente, alguns municípios mantêm nas Procuradorias setor responsável em apurar e aplicar punição aos seus servidores de maneira geral, sem distinção de sua função pública. Com a vigência da presente legislação federal, faz-se necessário, a criação de uma Corregedoria, sendo esta própria para apurar e aplicar punição aos servidores específicos do Quadro da Guarda Municipal, estando subordinada diretamente a Secretaria, a qual se encontra hierarquicamente vinculada a Guarda Municipal. DO REGISTRO DA ARMA DE FOGO PARTICULAR O Certificado de Registro de Arma de Fogo, o qual tem validade em todo o território nacional, deve ser expedido pela Polícia Federal, sendo precedido de autorização do Sistema Nacional de Armas – SINARM. Ainda, deverá ser renovado em período não inferior a 3 (três) anos, depois de atendidos os requisitos do Art. 10, § 1º, incisos I e III da Lei n º 10.826/03, em especifico para os Guardas Municipais das cidades com mais de 50.000 habitantes, conforme menciona o § 2º do Art. 11 da referida legislação, onde prevê a isenção das taxas aos integrantes dos incisos III e IV, do Art. 6º. Neste caso, independente de ser Capital, Região Metropolitana ou Cidade de pequeno porte, tendo esta mais que 50.000 habitantes, poderão os integrantes das Guardas Municipais, adquirirem arma particular com as respectivas isenções a que se refere a Lei n° 10.826/03. DO CADASTRO DAS ARMAS O Sistema Nacional de Armas – SINARM, instituído no Ministério da Justiça, no âmbito da Polícia Federal, tendo circunscrição em todo o território nacional, tem competência legal para cadastrar as armas de fogo institucionais, constantes de registro próprio das Guardas Municipais. Cabe ressaltar, que registros próprios são os realizados pela corporação, em documento oficial e de caráter permanente. Compete, ainda, ao Ministério da Justiça a fiscalização e controle do armamento e da munição utilizados pelas Guardas Municipais, podendo neste caso firmar convênio com as próprias prefeituras ou secretarias de segurança pública estaduais. Por fim, quanto à aquisição das armas de fogo e munições para as Guardas Municipais, convém ressaltar que a competência legal para expedir autorização é do Comando do Exército e a aquisição de armas de fogo pelos integrantes das guardas municipais na categoria de defesa pessoal é realizada através do Ministério da Justiça. PORTE DE ARMA INSTITUCIONAL Com o advento da Lei n.º 10.826/03, dois institutos foram apontados através da sua regulamentação, um tratando sobre o porte de arma de uso permitido à pessoa física e o outro à pessoa jurídica. Sobre a pessoa jurídica, cabe lembrar que se trata do porte de arma “funcional”, onde a instituição policial tem o direito de adquirir o referido armamento, repassando aos seus integrantes. Este porte de arma recai à pessoa jurídica, que por sua vez delega o “uso” e o “porte” da arma de fogo ao seu funcionário habilitado, podendo ambos virem a responder solidariamente pelo uso indevido do respectivo instrumento de trabalho. As Guardas Municipais das capitais dos Estados e dos municípios com mais de 500.000 habitantes, passaram a ter direito ao porte de arma “funcional”, durante e após o serviço. Em outras palavras, as que estiverem preenchendo os requisitos estatuídos pela legislação em vigor, poderão adquirir o armamento de acordo com seu efetivo total, cautelando individualmente aos seus guardas municipais; devendo, contudo, disciplinar em normas próprias os procedimentos relativos às condições para a utilização das armas de fogo de sua propriedade, inclusive para o uso da mesma fora de serviço. Cabe lembrar que para o porte de arma “funcional” existia a limitação territorial dentro do respectivo município, sendo que os guardas municipais residentes em outros municípios poderiam deslocar-se para as suas moradias ou retornarem ao seu trabalho, com o referido armamento, necessitando apenas a autorização para este deslocamento. Com o advento do Dec. n.º 5.871/06, o art. 45, do Dec. n.º 5.123/04, foi revogado, perdendo a eficácia este dispositivo legal, deste modo, com a ausência de norma regulamentadora, entende-se que a limitação territorial mencionada no art. 10, § 1º, da Lei n.º 10.826/03, está prejudicada ou inaplicável, entendendo-se com isso, que não existe dispositivo proibitivo quanto ao limite territorial para o porte de arma “funcional”, bem como extensivamente para o porte de arma “particular”. Quanto às Guardas Municipais da Região Metropolitana e dos municípios com mais de 50.000 e menos de 500.000 habitantes, passaram a ter apenas o direito ao porte de arma “funcional” estritamente em serviço, ou seja, estas corporações podem repassar o armamento aos seus guardas municipais, desde que os mesmos estejam em serviço, sendo vedada à utilização fora da sua jornada de trabalho. Quanto às Guardas Municipais da Região Metropolitana com população inferior a 50.000 habitantes, conforme o disposto no art. 6º, § 6º, da Lei n.º 10.826/03, com nova redação dada pela Lei n.º 10.867/04, inexiste qualquer previsão legal da sua quantidade populacional, como condição de liberação do porte de arma para os seus integrantes, aplicando-se deste modo, a sua respectiva previsão legal, dando direito aos servidores a terem, o direito ao porte de arma “funcional” estritamente em serviço, ou seja, estas corporações podem repassar o armamento aos seus guardas municipais, desde que os mesmos estejam em serviço, sendo vedada à utilização do referido armamento fora da sua jornada de trabalho. Para que os integrantes das Guardas Municipais mencionadas acima possam fazer uso do respectivo armamento da sua corporação, faz-se necessário que, além da existência da Corregedoria e da Ouvidoria em seu município, tenham os mesmos realizado treinamento técnico de no mínimo 60 horas para arma de repetição e 100 horas para arma semi-automática, conforme dispõe o art. 6º, § 3º, da Lei n.º 10.826/03. Ainda, a corporação deve submeter o seu funcionário a teste de capacidade psicológica a cada dois anos, ressaltando que, esta avaliação se dá em razão do direito e da capacidade de portar arma de fogo, ou seja, o legislador busca criar mecanismos a fim de verificar se o servidor durante este decurso de prazo sofreu alguma forte emoção capaz de causar um distúrbio temporário ou permanente a sua psique. Quanto ao possível envolvimento do guarda municipal em evento, onde haja disparo de arma de fogo em via pública, independente de existir vítima ou não, deverá o referido servidor apresentar Relatório Circunstanciado ao seu comando e ao órgão corregedor, a fim de se verificar se houve ou não abuso por parte do guarda municipal. Este dispositivo legal estava causando duplicidade de interpretação, pois numa leitura rápida do art. 43, do Decreto n.º 5.123/04, pode-se entender erroneamente que em todo o evento de disparo de arma de fogo, o servidor deverá realizar o teste de capacidade psicológica, o qual não encontra amparo legal ao analisar minuciosamente o respectivo artigo, devendo para tanto, ser feita a leitura separando-o em dois momentos. Por fim, depois de cumpridos os requisitos técnicos e psicológicos, estabelecidos pela Polícia Federal, à capacidade técnica e a aptidão psicológica para o manuseio de armas de fogo aos integrantes das Guardas Municipais deverá ser atestada pela sua própria instituição. Sobre o porte de arma “funcional”, cabem algumas considerações: Tratando das demais Guardas Municipais, as quais não foram abrangidas pelo texto legal em virtude de não se tratar de capital, Região Metropolitana ou município com população superior a 50.000 habitantes, há um tratamento desigual para a mesma função, exceção a regra é caso da Região Metropolitana como já vimos anteriormente. Cabe lembrar que nos municípios pequenos, o Estado geralmente não dispõe de efetivo e equipamento policial necessário, a fim de guarnecer esta localidade. Diante disso, muitas vezes, até os “delegados” são cargos de confiança exercidos por pessoas que sequer têm conhecimento na área de segurança e as delegacias destas pequenas comarcas são “vigiadas” por presos de confiança ou funcionários da prefeitura. Percebe-se, claramente, a necessidade destes municípios em terem nas suas Guardas Municipais, o efetivo exercício do poder de polícia, vindo a contar com seus integrantes no combate e prevenção ao crime. Não é a quantidade populacional, mas sim, a localização do município, a renda “per capita”, e principalmente, a atividade econômica desta cidade que podem trazer um diagnóstico claro e preciso sobre o índice de insegurança. Quanto às Guardas Municipais da Região Metropolitana e cidades com menos de 500.000 habitantes, o ideal é que estes municípios venham a ser assemelhados às capitais e grandes centros urbanos, no que tange ao porte de arma ‘funcional”, pois, além do acima exposto, ainda, existe o detalhe de que uma capital ou município bem policiado, com redução no índice de insegurança, conseqüentemente, terá ao seu derredor um possível índice de criminalidade acrescido, aonde o delinqüente acaba fugindo dos grandes centros urbanos, buscando abrigo e “trabalho” em outras localidades. PORTE DE ARMA PARTICULAR Quanto ao porte de arma particular aos guardas municipais, conforme está previsto no Art. 11, § 2º, da Lei n.º 10.826/03, além de ser permitido aos seus integrantes a aquisição e porte de arma de fogo, ainda, estão isentos do recolhimento de taxas de prestação de serviços relativos tanto ao registro, renovação e segunda via, quanto à expedição do porte federal de arma, renovação e segunda via, restringindo-se esta isenção a duas armas por servidor. Neste caso, o presente dispositivo legal não restringe apenas a duas armas, mas sim isenta as taxas devidas somente para estas armas, podendo contudo, o referido servidor ter mais armas, devendo neste caso arcar com as referidas custas. Cabe lembrar que, conforme Art. 28, da Lei n.º 10.826/03, os integrantes das Guardas Municipais das capitais e cidades com mais de 500.000 habitantes, ficam autorizados a adquirir arma de fogo “particulares”, tendo idade inferior a vinte e cinco anos. Nos demais casos, os integrantes das Guardas Municipais dos municípios, onde a sua população seja inferior a 500.000 e superior a 50.000 habitantes, somente poderá o referido servidor adquirir arma “particular”, tendo idade superior a vinte e cinco anos. Tratando-se do porte de arma “particular” categoria defesa pessoal aos guardas municipais acima mencionados, convém ressaltar que o referido porte não tem limitação territorial em relação ao município, uma vez que se trata de um porte de arma federal, sendo fornecido para uma arma particular e não pertencente à corporação. Torna-se prudente que as Guardas Municipais venham a manter em seus cadastros internos, junto ao assentamento funcional a relação do armamento particular dos seus servidores, mantendo com isso um controle indireto sobre as respectivas armas. Convém salientar que, independente da arma ser pertencente à corporação ou ao servidor, quando houver uma ocorrência (tanto interna quanto externa), envolvendo o guarda municipal de posse de arma de fogo, encontrando-se em estado de embriaguez, sob efeitos de substâncias químicas, alucinógenas ou medicamentos que provoquem alteração do desempenho intelectual ou motor, faz-se necessário o imediato afastamento das suas funções para tratamento especializado, devendo este preceito estar previsto na regulamentação interna quanto ao uso do respectivo armamento. Cabe lembrar, que se trata de uma infração administrativa, a qual prevê a sanção de perda do respectivo porte de arma “particular” e “funcional”, bem como apreensão da mesma pela autoridade competente. Por sua vez, caso o referido guarda municipal venha a ser surpreendido em uma das situações acima elencadas, o mesmo vindo a perder o direito ao porte de arma, poderá perante a sua corporação, tornar-se um servidor temporariamente inapto para efetivo exercício da função, assemelhando-se ao condutor de viatura que tem a sua Carteira Nacional de Habilitação suspensa por exceder a pontuação máxima prevista, devendo neste caso ser encaminhado para desempenhar funções administrativas até que se finde o processo administrativo ou resolvam-se os problemas impeditivos. *** Com a edição da Portaria do Ministério da Justiça, a qual outorga o direito ao porte de arma de fogo 24 horas aos agentes penitenciários, convém ressaltar, que de maneira diversa com o texto legal, o Ministério da Justiça entende que o porte de arma particular aos servidores elencados no art. 6º, da Lei n.º 10.826/03, deve ser fornecido pela respectiva instituição de origem. Convém ressaltar, que de acordo com o disposto na Lei n.º 10.826/03, art. 6º, inciso X, e § 1º - A, a instituição que tem efetivamente capacidade legal para fornecer porte de arma “particular” aos seus funcionários, em específico, são aos integrantes da Carreira Auditoria da Receita Federal, Auditores-Fiscais e Técnicos da Receita Federal. Neste caso, com a edição da presente portaria o Ministério da Justiça, estaria transferindo a competência exclusiva da expedição do porte de arma “particular” ao autorizar que os agente penitenciários equiparem-se aos servidores mencionados na Lei n.º 10.826/03, art. 6º, inciso X, e § 1º - A. CONFLITO DE COMPETÊNCIA SOBRE A EMISSÃO DO PORTE DE ARMA PORTE DE ARMA PARTICULAR A Polícia Federal, deverá conforme dispõe o estatuto do Desarmamento, dentre outras funções, manter o banco de dados do Sistema Nacional de Armas – Sinarm, do Ministério da Justiça, cadastrando as autorizações de Porte de Arma de Fogo e as renovações expedidas pela própria Polícia Federal. Ao fazermos a leitura do Art. 10 da Lei n.º 10.826/03, devemos observar o disposto no Art. 6º, § 3º, onde preenchidos os requisitos mencionados neste dispositivo legal, tais como: a condicionante para autorização do porte de arma de fogo, estar diretamente vinculada “à formação funcional dos seus integrantes em estabelecimentos de ensino de atividade policial, à existência de mecanismos de fiscalização e de controle interno”. Cumprindo as referidas exigências legais, por conseguinte, os servidores das Guardas Municipais, passam a equiparar-se ao disposto no § 4° do Art. 10, estando dispensados do cumprimento do disposto nos incisos I, II e III, do Art. 4º do Estatuto do Desarmamento. Deste modo, os integrantes das Guardas Municipais, quando da obtenção do Porte de Arma “particular”, expedido pela Polícia Federal, sem previsão de limitação territorial, poderão ter seu pedido deferido, depois de comprovado o previsto no Art. 6º, § 3º, devendo contudo, cumprir apenas as exigências do Art. 10, incisos I e III, excluindo-se a exigência do inciso II, uma vez que existe o requisito especifico para os servidores da Guarda Municipal, caso contrário, o legislador estaria sendo redundante e antagônico, conforme podemos observar no art. 36, do Dec. n.º 5.123/04, “A capacidade técnica e a aptidão para o manuseio de arma de fogo, para os integrantes das instituições descritas nos incisos III, IV, ... ... serão atestadas pela própria instituição, depois de cumpridos os requisitos técnicos e psicológicos estabelecidos pela Polícia Federal”. Tratando ainda do decreto regulamentador, cabe ressaltar que o Art. 42, trata dos critérios para a obtenção do porte de arma “particular”, referendando o acima exposto, sendo especificamente este o requisito indispensável para que a Polícia Federal venha a deferir o pedido do porte de arma, na modalidade defesa pessoa. A Lei nº 10.826/03, em seu Art.11, instituiu a cobrança de taxas, pela prestação de serviços relativos, à expedição e renovação de porte federal de arma de fogo; e à expedição de segunda via de porte federal de arma de fogo, isentando os integrantes dos incisos I, II, III, IV, V, VI e VII do art. 6º, corroborando com o acima exposto, quanto à competência legal para a expedição do Porte de Arma de Fogo na categoria defesa pessoal, em se tratando se servidores das Guardas Municipais. O supracitado dispositivo legal encontra a sua regulamentação no Dec. 5.123/04, em seu Art. 73, quando menciona que, “não serão cobradas as taxas previstas no art. 11, da Lei n.º 10.826/03, dos integrantes dos órgãos mencionados nos incisos I, II, III, IV, V, VI e VII do art. 6º, e em seu § 2º, esclarece que “a isenção das taxas para os integrantes dos órgãos mencionados no caput, quando se tratar de arma de fogo de propriedade particular, restringir-se-á a duas armas”, ressalte-se a isenção, não a limitação de aquisição. PORTE DE ARMA INSTITUCIONAL Quanto às armas de fogo pertencentes às Guardas Municipais, instituição, estas corporações poderão expedir porte de arma de fogo “institucional”, uma vez atendidos os critérios da Lei nº 10.826/03, bem como, firmando convênio com o Ministério da Justiça, conforme Art. 40, inciso III, do Dec. nº 5.123/04. Outro modo de obtenção do porte de arma institucional, para as Guardas Municipais é o que dispõe o art. 44, do referido decreto federal, onde neste caso, necessita que a instituição Guarda Municipal, tenha criado a Corregedoria própria e autônoma, para apuração de infrações disciplinares, bem como, a existência de Ouvidoria, como órgão permanente, autônomo e independente. Com o acima exposto, concluísse que a Identidade funcional mencionando a autorização para utilização da arma de fogo da instituição aos seus servidores, é o porte de arma institucional, abrangendo deste modo as armas da própria corporação. PONTOS CONTROVERSOS Atualmente com a edição da Portaria do Ministério da Justiça, o qual considera a identidade funcional do Agente Prisional, contendo a autorização do porte de arma aos seus agentes, além das armas institucionais, extensiva às armas particulares, dos respectivos servidores. Surgem algumas questões controversas, pois o Poder Público Federal, acaba transferindo a responsabilidade da Polícia Federal de emitir porte de arma de fogo, sendo assim estes portes de armas deverão ser expedidos na identidade dos servidores, sem a abrangência do limite territorial, uma vez que o Art. 22 do Dec. nº 5.123/04, menciona que o referido porte tem abrangência em todo o território nacional. O Decreto n.º 5.871, de 10 de agosto de 2006, e as Guardas Municipais Com a entrada em vigor do Dec. n º 5.871/06, o art. 45 do Dec. nº 5.123/04, foi revogado perdendo a eficácia do limite territorial imposta as armas da corporação, onde anteriormente “a autorização de Porte de Arma de Fogo pertencente às Guardas Municipais” tinham “validade somente nos limites territoriais do respectivo município”, podendo eventualmente ser autorizado para deslocamento nos casos onde o servidor (Guarda Municipal) residisse em outro município, diverso do seu local de trabalho. Com a revogação do presente dispositivo, para as armas da corporação quando estiverem em poder dos seus Guardas Municipais, quer cautelada permanentemente, quer momentânea, os referidos servidores podem portar as mesmas sem limitação territorial, uma vez que inexiste dispositivo legal proibitivo para este fim. CONSIDERAÇÕES FINAIS Acompanhando as legislações alteradoras do Estatuto do Desarmamento e o entendimento de alguns juristas, é possível que com a entrada em vigor do Dec. nº 5.871/06, possivelmente venha a ser editada uma Portaria pelo Ministério da Justiça, tratando do limite territorial (âmbito estadual) e permitindo o uso do armamento pelos Guardas Municipais 24 horas por dia, independente de ser arma institucional ou particular, desde que a corporação esteja em sintonia com o que dispõe a presente legislação vigente. Cabe ressaltar que em decisão judicial em primeira instância, na comarca de Curitiba, já existe julgado neste sentido, entendendo que “marginalizar a conduta do réu (Guarda Municipal) que estava com uma arma (particular) registrada de uso permitido com porte funcional e no horário de trabalho seria antes de tudo uma grande injustiça”. As maiores dificuldades encontradas para a interpretação do Estatuto do Desarmamento, estão nas palavras: à (s) Guardas Municipais, onde o legislador se refere a Instituição Guarda Municipal, e ao (s) Guardas Municipais, ou integrantes da, onde o legislador se refere, ao servidor que exerce a função de Guarda Municipal, e não a instituição em especifico. Esta dificuldade na interpretação é que acaba gerando toda esta intranqüilidade, incerteza e distorção na interpretação de um simples lei que deve ser lida e interpretada de maneira literal “ipsis litteris” – segundo as próprias letras.
Por : Claudio Frederico de Carvalho
INFRAÇÕES DE TRÂNSITO
Fiscalização de trânsito, conforme o conceito trazido pelo Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro, é o "ato de controlar o cumprimento das normas estabelecidas na legislação de trânsito, por meio do poder de polícia administrativa de trânsito, no âmbito de circunscrição dos órgãos e entidades executivos de trânsito e de acordo com as competências definidas neste Código". A fiscalização é exercida, em especial, pelos órgãos executivos de trânsito e rodoviários, integrantes do Sistema Nacional de Trânsito, os quais agem por intermédio dos seus agentes de trânsito, devidamente credenciados para tal mister. Logicamente, para que se controle o cumprimento das normas de trânsito, é imprescindível o conhecimento pormenorizado da legislação em vigor, que comporta inúmeros detalhes por vezes desconhecidos do motorista em geral. Analisaremos, no presente texto, alguns exemplos de números na fiscalização de trânsito, ou seja, as quantidades, medidas e prazos que devem ser avaliados para a configuração de determinadas infrações de trânsito (quando mencionado apenas o número do artigo, referimo-nos aos artigos do Código de Trânsito Brasileiro – Lei nº 9.503/97). TRINTA DIAS é o período de tolerância, após o vencimento da Carteira Nacional de Habilitação, para que não se configure a infração de trânsito do artigo 162, V (embora o texto do CTB mencione apenas a CNH, omitindo-se quanto à Permissão para Dirigir, o CONTRAN determinou a mesma tolerância ao documento provisório, conforme artigo 34, § 5º, da Resolução nº 168/04, com alteração da 169/04). DEZ ANOS é a idade mínima para o transporte de crianças nos bancos dianteiros dos automóveis, conforme o artigo 64, salvo as exceções previstas pelo CONTRAN na Resolução nº 15/98, sob pena de cometimento da infração de trânsito do artigo 168. Já para o transporte de crianças em motocicletas, motonetas e ciclomotores, a idade mínima é de SETE ANOS, de acordo com o artigo 244, V. CINCO METROS é a distância mínima, a contar da esquina, para a parada e o estacionamento de veículos (artigos 182, I e 181, I). Por outro lado, a distância lateral da guia da calçada ao veículo é de no máximo CINQÛENTA CENTÍMETROS (artigos 182, II e 181, II). UM METRO E CINQÛENTA CENTÍMETROS constituem a distância mínima lateral de segurança para o veículo que passa ou ultrapassa bicicleta, sob risco de cometimento da infração de trânsito do artigo 201. VINTE POR CENTO constitui o parâmetro de excesso de velocidade, acima da legalmente permitida, para que a infração de trânsito passe de grave para gravíssima (multiplicada por três), nas rodovias, vias de trânsito rápido e coletoras. Entretanto, nas estradas, vias arteriais e locais, essa mudança somente ocorre após excedido CINQÜENTA POR CENTO (artigo 218). SETE QUILÔMETROS devem ser descontados da velocidade aferida, para a obtenção da velocidade considerada na aplicação da multa por excesso de velocidade, nas medições de até 100 km/h (acima disso, deve ser descontado SETE POR CENTO), conforme Resolução do CONTRAN nº 146/03. CINQÜENTA POR CENTO da velocidade máxima de cada via determina a velocidade mínima dos veículos, respeitadas as condições operacionais de trânsito e da via, de acordo com os artigos 62 e 219. TREZE CENTÍMETROS por QUARENTA CENTÍMETROS é o tamanho oficial das placas de identificação dos veículos, sob risco de cometimento da infração do artigo 221, conforme previsão na Resolução do CONTRAN nº 45/98. No caso de motocicletas, motonetas e triciclos, o tamanho correto é de 13,6 CM por 18,7 CM. DEZ POR CENTO é a tolerância admitida, para mais ou para menos, no tamanho das placas de identificação, conforme a mesma Resolução acima citada. CENTO E QUATRO decibéis é o nível máximo permissível de pressão sonora emitida por buzina, de acordo com a Resolução do CONTRAN nº 35/98; entretanto, se o veículo tiver sido produzido a partir de 2002, o limite é de NOVENTA E TRÊS decibéis, caso contrário terá ocorrido a infração do artigo 227, V. Para que não se configure infração de trânsito do artigo 231, IV, as dimensões máximas de um veículo são de: DOIS METROS E SESSENTA CENTÍMETROS para largura, QUATRO METROS E QUARENTA CENTÍMETROS para altura e CATORZE METROS para comprimento (para veículos simples), conforme Resolução do CONTRAN nº 12/98. TRINTA DIAS é o prazo máximo para se efetuar o registro de veículo, junto ao órgão executivo de trânsito, após transferida a propriedade do veículo, para que não se cometa a infração do artigo 233 e conforme o artigo 123. QUINZE DIAS é o prazo máximo para que se promova a baixa do registro de veículo irrecuperável ou definitivamente desmontado, após a constatação da sua condição através de laudo, conforme artigo 240 do CTB e artigo 6º da Resolução do CONTRAN nº 11/98. CINQÜENTA METROS é a distância máxima em que devem existir faixas ou passagens destinadas a pedestres, para que estes sejam obrigados a utilizá-las, de acordo com o artigo 69, sob pena de cometimento da infração de trânsito do artigo 254, V (embora ainda não haja regulamentação para aplicação de multas a pedestres). Vejam que, em apenas QUINZE exemplos, tivemos a oportunidade de tratar de VINTE artigos do CTB e de OITO Resoluções do Conselho Nacional de Trânsito, o que evidencia a necessidade de especialização e constante atualização por parte do agente de trânsito, que não pode se valer, muitas vezes, da simples constatação direta para determinar se houve ou não a infração de trânsito, mas deve demonstrar ao órgão executivo de trânsito qual foi a forma de comprovação de cada infração. Quando tratamos de dias, não há dificuldade em tal comprovação, mas e quando tratamos de distâncias e medidas? Para as medidas, óbvio que será necessária a utilização do devido equipamento, previamente regulamentado pelo CONTRAN, para determinar, por exemplo, o excesso de velocidade ou o excesso de pressão sonora da buzina. No que se refere às distâncias, em nosso livro "Instalação de funcionamento de Juntas Administrativas de Recursos de Infrações – Manual para análise de recursos (Editora Cantareira, 2006)", tecemos os seguintes comentários: ...Nestes casos, temos defendido a idéia de que, assim como em outras situações que necessitam da análise do agente, valerão o seu discernimento e a sua capacidade técnica de observação, características que, dada a experiência e vivência práticas, tendem a se consolidar e gerar maior segurança para a convicção do cometimento dessas infrações. Não obstante, para que não haja dúvidas de que a infração foi cometida e para que a JARI possa julgar o recurso com coerência, é importante notar se o agente, no campo de observações do AI, descreveu a situação fática encontrada e que evidenciou que a conduta, realmente, era irregular, por exemplo, mencionando a distância em que o veículo se encontrava da esquina ou da guia da calçada... Enfim, se a lei prevê determinados detalhes, estes devem estar adequadamente comprovados, para que os eventuais infratores sejam realmente punidos.
Por: Julyver Modesto de Araujo
Política criminal e a Lei nº 11.343/2006: descriminalização da conduta de porte de drogas.
1. Nova Descrição Típica para a Conduta de Porte para Uso Próprio de Substância Entorpecente Mudou o controle penal estabelecido pela Lei nº 11.343/2006, aqui denominada de Lei Antidrogas. Tal mudança não se restringiu apenas ao conteúdo semântico do tipo penal em exame, que abandonou as expressões “trazer consigo para uso próprio” e “substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica”. No entanto, de maior significado penal foi, sem, dúvida a opção por uma Política Criminal de rejeição da prisão como instrumento válido de resposta punitiva à conduta do consumidor de drogas. Assim é que, de conformidade com o disposto no § 2º, do art. 48, tratando-se de consumidor, “não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente”. Portanto, em hipótese alguma, o usuário de drogas poderá ser levado à prisão. Ressalte-se que essa forma de enfrentamento do conflito sem prisão já é prevista no parágrafo único, do art. 69, da Lei 9.099/95. Cremos que esta norma – na esteira de boa parte da doutrina e da jurisprudência – por ser mais favorável ao infrator, é aplicável mesmo durante o prazo de vacatio legis. A descrição do tipo penal, embora tenha se mantido próxima da anterior (art. 16, da Lei 6.368/76), refere-se agora ao consumo pessoal de drogas, sem autorização ou em desacordo com determinação legal. Em termos de técnica legislativa e de semântica jurídica, o texto legal ficou mais claro e taxativo, o que é positivo. A nova infração penal está descrita no art. 28 e seus incisos, com a seguinte redação: “Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido a uma das seguintes penas: I - “advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo”. O prazo máximo cominado é de cinco meses, podendo ser dobrado no caso de reincidência (art. 28, §§ 3º e 4º) e as penas podem ser aplicadas cumulativamente ou substituídas entre si (art. 27) A pena de advertência - até então, desconhecida do Direito Penal brasileiro - representa uma autêntica inovação, mas não apresentará dificuldade para se conhecer o seu sentido jurídico e o modo de aplicação. O próprio dispositivo determina que o juiz deve esclarecer ao “condenado” sobre as conseqüências, nocivas à saúde, do uso de drogas. O mesmo deve ser dito e, com maior razão, em relação à pena de prestação de serviço à comunidade, que já integra o rol das penas restritivas de direitos previsto no art. 43, do CP, de reduzido grau de aplicação, no campo da práxis judiciária. Certamente, terá um destino pouco exitoso em termos efetiva aplicação e execução. Quanto à medida educativa de comparecimento a programa ou curso, trata-se de sanção penal nova. O texto contém um pleonasmo: se a medida é de natureza educativa, não havia necessidade de se acrescentar o adjetivo educativo ao substantivo curso, conforme consta do inciso III, do referido art. 28. De qualquer forma, deve o programa ou curso ser previamente habilitado para que a nova medida possa ser aplicada pelo juiz. Aqui, a experiência indica que, mais uma vez e sem trocadilhos, estamos diante de uma norma apenas programática. Parece que a “repressão” ou o controle do “crime” de porte para consumo pessoal de drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal vai se restringir à aplicação da medida de advertência, ao consumidor, sobre os efeitos das drogas. É mais simples, mais rápido e mais fácil de ser efetivada. No tocante ao procedimento penal, o portador de droga para consumo pessoal será processado e julgado na forma dos arts. 60 e seguintes da Lei nº 9.099/1995. Assim sendo, já na audiência preliminar, poderá o representante do Ministério Público apresentar proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade, ou seja, de uma das três penas cominadas no art. 28, da nova Lei Antidrogas. 2. Consumo ou Tráfico de Pequena Quantidade: A Difícil Tarefa Diferenciadora! A realidade tem demonstrado que, em muitos casos, é extremamente difícil identificar se a conduta típica configura a hipótese de porte para consumo pessoal ou de tráfico de pequena quantidade. Geralmente, as quadrilhas do tráfico comercializam a droga em doses ou porções reduzidas. São os “papelotes” de cocaína; os “baseados” de maconha; as “pedras” de craque; os compridos ou pílulas de “êxtase” ou de anfetaminas e utilizam para a execução desse sinistro comércio pequenos traficantes que são, também, consumidores. Estes pagam o preço de seu vício com o trabalho sujo de repassar a droga a outros, também, consumidores e compradores. Para enfrentar essa difícil tarefa diferenciadora e identificar se, no caso concreto, a conduta estava sendo praticada por um simples consumidor ou por um traficante de drogas, a nova lei determina que “o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente” (art. 28, § 2º). Verifica-se que a lei estabelece os elementos e as circunstâncias a serem, obrigatoriamente, analisados pelo juiz a fim de decidir se o caso é de porte para consumo pessoal ou de tráfico. O dispositivo, ao fixar os marcos intransponíveis do espaço de liberdade e de convicção pessoal do juiz, tem a finalidade de objetivar os motivos da decisão judicial. Porém, é inevitável que o juiz, mesmo assim, disponha de elevado grau de discricionariedade para apreciar, no caso concreto, a presença, a dimensão e a relevância de cada um dos elementos e circunstâncias descritos no referido parágrafo. Mesmo assim, não será uma tarefa judicial fácil de ser desempenhada. A própria Lei Antidrogas, admitindo essa dificuldade, criou uma outra modalidade típica situada entre o simples consumo pessoal e o tráfico ilícito de drogas. Trata-se da conduta consistente em oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para consumo conjunto (art.33, § 3º). Há, também, a causa de redução de pena, de um sexto a dois terços, para o “agente primário e de bons antecedentes (§ 4º). Essas duas formas punitivas bem mais brandas, em comparação com a natureza e a intensidade da penas previstas para o crime de tráfico ilícito de drogas, porém mais severas em relação às sanções não prisionais cominadas ao consumidor de drogas, em determinados casos concretos, poderão representar alternativas penais às duas formas extremadas de controle penal positivado na atual Lei Antidrogas. 3. Consumo Pessoal de Drogas, sem Autorização Legal: Inusitada Espécie de Descriminalização Branca Em termos de Política Criminal, a Lei de Drogas não atendeu à corrente doutrinária que defendia a pura e simples descriminalização da conduta consistente no porte para uso pessoal de substância entorpecente. Mas, também não manteve a solução da lei anterior, que cominava pena privativa de liberdade para esse tipo de infrator. Acabou prevalecendo a opção por uma espécie de descriminalização branca. Como a lei não admite o uso da prisão, nem mesmo no caso de reincidência e/ou de não cumprimento das sanções não-detentivas aplicadas pelo juiz, na prática, o usuário acabará excluído do controle penal. Isto não deixa de ser inovador, pois o atual sistema penal ainda se encontra ancorado na prisão como pressuposto nuclear de validade e de eficácia do sistema punitivo vigente. Na verdade, a Lei 11.343/06 criou uma figura típica inusitada em nosso Direito Penal. A rigor, a conduta de porte para consumo pessoal não pode ser considerada crime ou contravenção, que são as duas espécies de infração admitidas em nosso sistema penal. Nos termos do art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal, “crime é a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente”. É possível argumentar que a Lei Antidrogas é norma posterior e, ao dispor de outro modo, acabou criando uma nova espécie de infração criminal para a qual foram cominadas penas distintas da detenção e da reclusão. Assim, a partir de agora, nosso sistema penal estaria convivendo com duas espécies de crimes, quanto à natureza das penas cominadas. A conduta típica de consumir drogas seria o único crime não punido com pena de detenção ou reclusão, enquanto que todos os demais crimes, previstos no Código Penal ou nas leis especiais, continuariam legalmente classificados pela marca da pena privativa de liberdade. Argumenta-se, também, que o Capítulo III, da Lei de Drogas, que define o “crime” de consumo pessoal de drogas, refere-se aos crimes e às penas. Portanto, é o próprio texto legal que classifica como crime, de forma expressa, essa nova espécie de infração penal. No entanto, é preciso observar que o parágrafo 1º, desse mesmo artigo, ao sancionar o semeador ou cultivador de drogas para consumo pessoal reporta-se à aplicação das “mesmas medidas” e não das penas. Isto constitui uma contradição jurídica em relação ao disposto na rubrica do próprio capítulo e deve ser considerada para se estabelecer a correta natureza jurídica desta nova conduta típica. Além disso, é preciso não esquecer dos princípios que fundamentam a Lei Antidrogas. No tocante ao simples usuário ou consumidor, o artigo 1º é taxativo ao dispor que “esta lei (...) prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas”. Este é um dos princípios que orientam todas as normas integrantes da Lei 11.343/06. E, em seu texto, não há qualquer referência à repressão, pena, nem a crime. E todos sabemos que os princípios, em termos de hierarquia normativa, pairam num plano superior ao das normas. Diante disso, cremos ser mais razoável o entendimento de que a Lei Antidrogas criou uma nova infração penal, que não se enquadra na classificação legal de crime, nem de contravenção penal. Criou, simplesmente, uma infração penal inominada, punida com novas alternativas penais e isto não contraria a diretiva genérica de classificação das infrações penais, emanada do referido dispositivo da Lei de Introdução ao Código Penal. No texto da Lei Antidrogas, podemos perceber o compromisso com uma nova proposta de Política Criminal em relação ao consumidor de drogas: prevenção, atenção e reinserção social. E isto constitui um forte argumento de hermenêutica jurídica em favor da tese de descriminalização da conduta de porte para consumo pessoal de drogas. No mínimo, de uma imprópria descriminalização branca.
LEI SECA
É impressionante o modo como o legislador brasileiro mantém seu padrão. A cada nova lei que promete aumentar o rigor contra o crime, tem-se a nítida sensação de “deja vu”. Ou seja, aquela “lei revolucionária” que promete acabar com o crime é apenas mais um engodo para satisfazer e amedrontar a população. A Lei 11.705, de 19 de junho de 2008, é apenas mais uma que irá impressionar e, pouco depois, cair em descrédito e ser esquecida. Será parte do rol que inclui, entre outras, a Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.078/90), a Lei de Tortura (Lei 9.455/97), a lei que inclui o assédio sexual no Código Penal (Lei 10.224/04), o Estatuto de Desarmamento (Lei 10.826/2003), etc. O próprio Código de Trânsito Brasileiro provocou grande alvoroço quando da sua publicação (Lei 9.503/97), inclusive com decréscimo imediato do número de mortes no trânsito. Porém, pouco tempo depois, a situação voltou ao estado anterior. Isso acontece por duas razões básicas: defeitos na redação da lei que tornam sua aplicabilidade, no mínimo, bastante problemática e, principalmente, por problemas administrativos. A ineficiência típica da Administração Pública e a falta de meios para fazer cumprir a lei tornam o diploma legal apenas uma promessa vazia. Eventualmente, a lei chega a ser cumprida, mas, em proporções tão ínfimas com relação ao número efetivo de crimes que os condenados podem ser considerados verdadeiros bodes expiatórios. Como será visto, esses mesmos erros são repetidos na nova lei. O critério adotado pela lei para considerar a conduta de dirigir embriagado como ilícito administrativo (0,02 g/l) ou como crime (0,06 g/l) impressiona se comparado com outros países: é mais rigoroso do que aquele adotado por nações tradicionalmente zelosas no cumprimento da lei, como Estados Unidos (0,08 g/l), Canadá (0,08 g/l), Dinamarca (0,08 g/l) e Inglaterra (0,08 g/l). Será que o Brasil, que tem a infeliz tradição de pouco rigor na repressão aos crimes, estaria-se tornado um país em que é adotada a ideologia da “lei e ordem”, ou seja, da repressão total? De modo nenhum. Pelo contrário, a lei facilita a vida daqueles que dirigem bêbados. A razão é simples: adotou-se, de forma inédita, um critério matemático para a definição do crime de embriaguez ao volante. E esse critério só pode ser aferido por meio da utilização do etilômetro, popularmente conhecido como bafômetro. Daí, decorrem dois problemas seriíssimos para a efetividade da lei. Primeiramente, ninguém pode ser obrigado a produzir provas contra si mesmo (“privilégio contra a auto-incriminação”). Assim, ao contrário do que tem sido feito, ninguém pode ser compelido a assoprar no bafômetro. Caso a pessoa exerça esse direito e recuse-se a produzir provas contra si mesma, nada poderá ser feito para comprovar a existência daquela quantidade específica de álcool no sangue. Estaria, assim, impossibilitada a condenação. A lei conseguiu produzir a risível situação de que a condenação do réu depende apenas dele mesmo! Atualmente, apenas dois tipos de pessoas submetem-se a esse teste: os desavisados, que não têm conhecimento da existência desse direito, e aqueles que se sentem coagidos pela polícia. Nas duas situações, a prova será obtida por meios ilícitos e, portanto, de uso vedado no processo penal. Em segundo lugar, tem-se a barreira que impede a eficaz aplicação das leis “bem intencionadas”: os limites da Administração Pública no Brasil. De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 150.000 motoristas dirigem bêbados todos os dias. Ora, não há, nem de longe, policiais e bafômetros suficientes para fiscalizar essa quantidade de pessoas. A Polícia Rodoviária Federal, por exemplo, tem apenas quinhentos bafômetros e pretende adquirir outros mil, número ainda bem inferior ao necessário. Além disso, as blitze com a única finalidade de encontrar motoristas bêbados, que tanto atemorizam atualmente, deverão ser drasticamente diminuídas com o passar do tempo, pelo simples motivo de que a polícia não tem efetivo suficiente para cuidar dos crimes em geral, quanto mais deste específico. Em um verdadeiro Estado de Direito, as leis existem para serem cumpridas. No nosso “Estado demagógico”, essa finalidade é bastante secundária e, às vezes, inexistente nas leis penais. Aqui, a verdadeira finalidade da lei é servir de plataforma política para determinados grupos, uma versão solenizada da campanha eleitoral. São promessas inconseqüentes, cujo descumprimento não acarreta nenhuma responsabilidade daqueles que as fazem. A alegação, corrente na doutrina, de que a lei restringe excessivamente os direitos individuais é verdadeira apenas em tese. Algumas pessoas serão presas e condenadas, servindo como o típico “bode expiatório”. Outras, mais conscientes do funcionamento do sistema, não resistirão à tentação de pagar uma propina para o policial. Enfim, para a maioria da população, será apenas mais uma daquelas “leis que não pegam”. Vale fazer uma comparação com o Reino Unido: além de admitir um limite de álcool no sangue maior que no Brasil, a pena por dirigir embriagado é de até seis meses de reclusão, enquanto que, aqui, a pena pode chegar a três anos. Essa situação é muito semelhante em vários estados norte-americanos. Porém, nesses dois países, o número de mortes no trânsito é proporcionalmente bem inferior ao registrado no Brasil, pelo simples motivo de que, neles, a lei é efetivamente cumprida. Parece que, a todo o momento, é esquecida a advertência do Marquês de Beccaria: antes de pensar-se em leis mais rigorosas, deve haver a preocupação de cumprir-se as já existentes. Vários autores têm reclamado de um pretenso caráter autoritário ou até mesmo totalitário da lei. São observações bastante exageradas, mesmo se considerássemos apenas o texto frio da lei. Comparando o texto legal com as intenções reais ocultas, tais pontos de vista são, no mínimo, ingênuos, e, na pior das hipóteses, cínicos. A lei é, de fato, inconstitucional. Mas, não pelos motivos freqüentemente ventilados. Sua inconstitucionalidade baseia-se no fato de que foi feita demagogicamente para não produzir efeitos, em uma violação nítida aos princípios da razoabilidade, da finalidade e da eficiência. Por: Alexandre Magno Fernandes Moreira.
SUJEITO ATIVO DO CRIME DE DESACATO
NOÇÃO DE BEM JURÍDICO
Ao tratar da noção de bem jurídico, Noronha [1] afirma que o bem tutelado pelo crime de desacato é, como já dito, a dignidade, o prestígio, o respeito devido à função pública. O Estado é diretamente interessado em proteger o respeito a essa função, pois ele é indispensável à atividade e à dinâmica da administração. Sem o devido respeito, os agentes públicos não poderiam exercer, de modo eficaz, suas funções, por via das quais é atingida a finalidade superior, de caráter eminentemente social, que a administração busca e procura.Diz-se que é impossível estabelecer uma disciplina social e política se os órgãos públicos, através dos quais o Estado cumpre a sua função constitucional, são desrespeitados. [2]Antonio Pagliaro e Paulo José da Costa Júnior, refletindo acerca do bem jurídico tutelado pelo crime de desacato, afirmam curiosamente o seguinte:A honra do funcionário é tutelada, mercê do desacato, de modo muito mais rigoroso do que a honra do particular. Tal se dá porque o funcionário é portador de um interesse público, desempenhando posto de particular relevo no ordenamento do Estado. [3]Pode-se perceber a importância que a noção de bem jurídico tem para o legislador penal. Em razão desse crime busca-se resguardar a base da atuação eficaz da administração pública (eficácia, segundo Capez [4], no sentido de fiel execução), através dos seus prepostos, os funcionários públicos, que são os instrumentos de persecução da finalidade superior estatal. Essa base de atuação eficaz nada mais é que o respeito devido à tarefa hercúlea de realizar a vontade pública.Logo, quando alguém desacata um funcionário público, desrespeita, em primeiro lugar, o próprio Estado presentado e representado pela vítima (conforme alhures mencionado) e, em segundo lugar, a própria vítima (em sua honra), pois o crime é pluriofensivo. O bem jurídico lesado pelo crime de desacato é, portanto e em última análise, a honra funcional, que pertence à vítima, mas que também está acima dela, pois a mesma é indisponível.
QUALQUER PESSOA
O sujeito ativo do crime pode ser qualquer pessoa. Qualquer do povo pode desacatar um funcionário público. A esse respeito, não há divergências. Doutrina e jurisprudência são unânimes em considerar como sujeito ativo de desacato qualquer do povo.O advogado pode cometer desacato no exercício da sua atividade profissional? Capez [5] afirma que o advogado, a partir da liminar concedida na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.127, pode cometer crime de desacato. O Art. 133, CF da Constituição Federal de 1988 dispõe: “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Percebe-se que o legislador constituinte, ao consagrar a inviolabilidade do exercício da advocacia, mandou que a lei a limitasse.A Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), cumprindo o mandamento constitucional, dispôs, no seu Art. 7º, § 2º, que:O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis, qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer.O Supremo Tribunal Federal, todavia, ao conceder a liminar alhures mencionada, suspendeu a eficácia da expressão “desacato”, contida no dispositivo da Lei nº 8.906/94. Segundo Ney Moura Teles [6], o STF, até esta data, quase dez anos após o ajuizamento, ainda não julgou o mérito da ação.Conforme o entendimento do STF, a imunidade prevista no Art. 133, CF somente poderia abranger os crimes contra a honra, e não os crimes contra a Administração. Disso resulta, portanto, que o advogado pode cometer desacato.3
FUNCIONÁRIO PÚBLICO DESPIDO DA CONDIÇÃO
É majoritário o entendimento de que o funcionário público também pode desacatar, ele também pode ser autor do crime de desacato. Para que isso ocorra, é preciso o funcionário público despir-se da sua qualidade ou agir fora da sua própria função. Discute-se, porém, se é possível falar-se em desacato quando o agente é funcionário público e a ofensa se refere às funções públicas.
FUNCIONÁRIO PÚBLICO SUBORDINADO E FUNCIONÁRIO PÚBLICO SUPERIOR HIERÁRQUICO
Certamente, aqui se encontra o ponto de maior divergência doutrinária e jurisprudencial deste trabalho. É, também, ao lado do bem jurídico, o núcleo central da abordagem do tema proposto.Em se tratando do sujeito ativo do delito em apreço, podemos apresentar os três posicionamentos existentes acerca do fato de funcionário público poder ser ou não sujeito ativo de desacato. [7]Segundo a primeira corrente (Nélson Hungria, Vicente Sabino Júnior, Manzini, Antolisei) o funcionário público não pode ser sujeito ativo de desacato, a não ser que se tenha despido da qualidade funcional ou o fato tenha sido cometido fora do exercício de suas funções. Como o desacato encontra-se no capítulo dos crimes praticados “por particular” contra a administração em geral, entende-se que o autor deve ser um estranho. Se o autor for um funcionário público, não haverá desacato, subsistindo a ofensa como infração autônoma (injúria, lesão, ameaça etc.). Não há orientação dominante em nossa jurisprudência. [8]Contra essa primeira corrente, tem-se o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça: “O crime de desacato, por ser crime comum, pode ter no seu pólo ativo qualquer pessoa, inclusive funcionário público”. (STJ, HC 9.322/GO, Rel. José Arnaldo da Fonseca, DJU, 23-8-1999)E, ainda, segundo o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (RT 760/692-3), o funcionário público pode sim ser sujeito ativo do crime de desacato, a exemplo do Promotor de Justiça que foi desacatado (agredido verbalmente) por funcionário público. O TJRJ entendeu que, no caso retro citado, houve desacato, pois o bem jurídico tutelado era (e é) o prestígio da função pública.Para a segunda corrente (Nélson Hungria, Bento de Faria, Luiz Regis Prado, Manzini), o funcionário público pode sim ser sujeito ativo, desde que seja inferior hierárquico em relação ao ofendido. Se for superior ou se exercer funções de igual categoria, não há desacato. Esta segunda corrente é criticada por Heleno Cláudio Fragoso, Magalhães Noronha, Nino Levi e Stefano Riccio. [9]Também contra esse entendimento, são os dois julgados a seguir:O sujeito ativo do desacato, segundo pressupõe a lei, há de ser extraneus, mas a este se equipara o funcionário que, maltrata física ou moralmente a outro in officio ou propter officium. (TACRIM-SP – AC – Rel. Albano Nogueira – JUTACRIM-SP 73/235)Por outro lado, o “sujeito ativo do crime” (de desacato) pode ser qualquer pessoa, inclusive o funcionário público, quer exerça, ou não, a mesma função do ofendido (trecho do voto vencido do Juiz Goulart Sobrinho). (TACRIM-SP – AC – Rel. Lacerda Madureira – RT 452/386)Já para a terceira corrente, o funcionário público pode ser sujeito ativo de desacato em qualquer hipótese, seja superior ou inferior hierárquico à vítima. Damásio [10] filia-se a esta terceira corrente. O funcionário público que pratica o fato contra outro despe-se dessa qualidade, equiparando-se ao particular, pois se o bem jurídico é o prestígio da função pública, seria incompreensível haver lesão apenas quando a conduta fosse praticada por particular. Essa terceira corrente encontra fundamento em Heleno Cláudio Fragoso, Magalhães Noronha, Paulo José da Costa Júnior, Antonio Pagliaro Riccio, Maggiore, Vannini e Nino Levi. [11] Essa corrente é a posição mais aceita na doutrina.